terça-feira, fevereiro 21, 2012

Nuno Moura.

Alguma da poesia mais interessante do virar do século e depois pertence a Nuno Moura. No ano 2000 fez sair na Mariposa Azual um livrinho de umas trezentas páginas onde, sob o nome de oito pseudónimos dava largas à sua inventiva poética. Nuno Moura não facilita e não encaixa. Nas correntes das escritas de poesia do rectângulo não há bem onde o meter. Assim o leio e espero não enganar-me, pois assim está bem.
Agora transcrevo, desse bendito livro, esquecendo a pseudonomia.




"dentro das pernas cabe um braço
mas a superioridade da língua
baralha tudo


#


Uma mulher vai na parte mais bonita da rua.

O seu gelado passa de boca em boca no passeio contrário
mas pouco dos galos a combusta.

Apetece-lhe chegar a casa e pôr a cabeça sobre os pêlos~
do peito.

Ficava-lhe bem uma barba postiça lá para baixo
mas há muito tempo que não o faz.

Um cigarro antes de dormir.
Um beijo para acordar o charlie brown.
A camisola de ginástica perto do saco perdido de frio.


#


Apanhou o táxi e disse, - um desastre quanto é?


#


estarei na paragem do setenta e oito
e do trinta e cinco
mas de certeza
na do trinta e dois dos teus pés


#


o pequeno pede ao pai
para ele pôr o jimi hendrix bem alto.
O pequeno acompanha
a música batendo o ritmo nas pernas do pai.
O pai nunca ouviu jimi hendrix assim


#


eu tenho um olho torto que é o que escreve.
o que está quieto
só vê.


#


um homem bebe uma água e deixa-se estar.


#


13 de janeiro

a mascote que me acompanhou hoje foi um cão.

andou toda a tarde nas minhas costas.

as pernas abrem-me pelos joelhos e o alívio que sai
é uma corrente de ar que me traz sangue ao nariz.

por cima das botas do cão estão ossos bem aproveitados.

o pulso direito não corta a meta."

domingo, fevereiro 19, 2012

Adraar Bous aka Nuno Moura

"cinco saídas fechadas são os dedos de muitas mãos"


in Os Livros de (...), ed. Mariposa Azual, 2000.

Sobre um suicídio e outras merdas.

Há uma meia dúzia de anos um médico meu conhecido foi a uma consulta com o seu pneumologista para rever uns exames que tinha feito. Este médico de que falo já tinha mais de sessenta anos, ainda não se tinha reformado por aquela coisa de ser a medicina um traje difícil de despir. Uma tosse aborrecida, uma pontada, um cansaço. Um cancro do pulmão de respeito. O médico de que falo, galego como poucos, disse duas chalaças e apertou a mão ao pneumologista, conhecido de anos. Disse ainda que "pronto, vamos lá tratar isto!". Dirigiu-se ao seu gabinete, abriu a janela, saltou. O hospital onde fiz intensivos é alto, dele apanha-se uma boa vista da ria e de Santa Cristina. A história pode não ter sido bem assim, mas o "osso" foi.

A primeira vez em que me defrontei com a noção, a possibilidade do suicídio, foi através da peça "Português, Escritor, Quarenta e Cinco Anos de Idade", escrita por Bernardo Santareno e compreensívelmente só representada depois do 25 de Abril. Semi-autobiográfica, o autor foi representado na peça por Rogério Paulo, com aquela maldita voz e aquela maldita cara que fizeram de Rogério Paulo um monstro em palco. Nada comunista eu então e hoje, a peça ficou comigo, bem como o suicídio final do personagem, para que ao menos a última decisão dele fosse. Morrer, verbo que é bem mais do que a morte, que por definição não há, pode ser a única decisão que nos resta quando julgamos já estar tudo decidido - e perdido. Não é a vida um jogar incessante, nem que sempre nos pareça estarmos no banco da vida a olhar para o campo, a olhar, a olhar, os outros em jogo e nós nunca?

Diferente é quando alguém bem mais jovem do que eu, e a fasquia da juventude transporto-a eu comigo e comigo tem vindo a envelhecer também, repito que é diferente quando alguém bem mais jovem do que eu decide terminar com a vida. E a diferença está em - "porque ela e não eu?"

Viver o que é? Ainda há pouco um rapaz meu conhecido definia-me aqui o jazz em três penadas, "música com swing", já lá dizia a canção. Lembro uma vez numa praia ouvir que aquilo sim, é que "era viver!". Nessa praia o mar era todo o swing necessário.
A cada um a sua vida. Uns dirão: "a minha vida é olhar para o mar, e tudo o resto que faço nos intervalos em que o mar não está!". Mas a vida tem essa inexorável lógica de projecto em marcha, em aberto. E em frente assume-se - há caminho! O projecto pode ser o mesmo mar de que falei, o sol, os dias que abrem - como estão a abrir neste radioso e frio fevereiro donde escrevo. Os elementos, que mais, dizia o Clooney.

Porque não eu? A razão mais simples e óbvia é a filha que tenho. Não consigo descer para este que não é papel mas um ecrã de computador tudo o que a minha filha me dá. Mas deixo quem aqui não repousa. E volto aos sentidos. Que ainda não os tenho assim de cansados. Eu quero ver mais, e tocar mais, e cheirar mais, e ouvir mais, e mergulhar a mão onde. Sei, eu sei, que destas coisas as minhas bibliotecas ainda não estão completas. Também hoje conheço mais amplamente de que males padeço, donde fujo, para onde quero sempre ir. Refractário, penso e penso e penso que penso. Curto de mangas e portanto de truques. E para sempre esboço.
Respirar tinha nos tempos antigos uma lógica mágica, era o "sopro". Nem sempre respiro igual. Logo estou vivo, e quero viver mais. Porque este sopro imparável empurra-me para a frente, e os nós da vida, afinal, servem-me de apoio e com eles disfarço e até parece que subo.

Outra coisa: rir. A vida de tão absurda é muito cómica, não é? Portanto, o riso. O rir que nasce da curiosidade, da graça, de uns olhos que procuram, de uns ouvidos que ouvem. Rir é viver mais. Algumas vezes rimos os dois, Susana, vai para alguns anos. Chegámos.

Sabes bem, Susana, que não devo e não vou falar de ti, porque não sei quem tu eras e as suspeitas esbarram no teu dia de ontem. Acabei de explicar porque estou aqui a escrever e não perdido da vida como tu. Falei demasiado de mim quando o dia de ontem tornou-se para sempre teu. Mas, o que dizer? Disse portanto, para ganhar tempo, de mim coisas vazias e, algumas até, sem qualquer sentido. Muletas para um pobre viajante. Devo agora calar-me.

O teres morrido é para mim inexplicável. Parece-me também tremendamente injusto.

terça-feira, fevereiro 14, 2012

It's a Dirty Day

U2 - Dirty Day - ZooTv Sydney

U2 Dirty Day lyrics

domingo, fevereiro 12, 2012

Lugo - uma história galega de terror - 1.

Da janela via as muralhas. Romanas. Património de uma humanidade que, congelada pela onda de frio, apressava-se lá em baixo, entre ela e a muralha. Vendia seguros. Mas, quem pode estar seguro nestes dias que correm?

"Seguros Valenciana, seguro toda a semana!". Vinte a anos a vender seguros, a sua obra-prima. Não se suicidar, não parar, não correr quando os outros mandam mas apenas quando o coração lhe pedia. E que já não pede. Porque não a despedem? Este escritório o único privilégio, não há outro com vista para as muralhas, não há. Privilégio será mas não são muralhas, ou não o foram? Uma muralha é uma coisa boa ou má? Publicitada como o circuito de manutenção mais antigo do mundo - porque não dar umas voltas a Stonehenge, pensara? - há dois mil anos desta janela com vidro duplo veria apenas soldados e fogueiras e tendas, enfim, não veria nada, este ângulo de visão impossível, só se estivesse no mais alto de uma daquelas torres de assalto que os inimigos de Roma não sabiam construir, nada de confusões no tempo, menos ainda no espaço, naqueles tempos fora da muralha era o campo, o gelo, o inverno rigoroso do Conventus Lucencis. Enfim, sabia umas merdas, há vinte anos que vendia seguros, algo mais tinha aprendido, para entreter, para entreter.

Tinha sido ela a pagar os vidros duplos, mas não apenas, não eram poucos os dias em que se confundia e considerava aquele espaço a sua primeira casa, que nem a segunda devia ser, diziam-lhe. Igual a estante na metade esquerda da parede em frente, o espelho assimétrico. E a vela aromártica e o pequeno santuário a Xiva na direita baixa, ao lado do aquecimento. Porque um dia visitaria a Índia. E Bali. E Hong Kong. E África. Um dia. Lá fora o frio gerava a pressa necessária. Sem clientes, porque não a despediam? Era a única que naquela sucursal nortenha de uma empresa sediada no mediterrâneo ainda vendia alguma coisa. A Lurdes mantinha-se porque dormia com o patrão, o Gonçalo era aquele rapaz que nunca dizia que não, tão prático e tão útil, enfim. Ela...

- Silvana, tens cliente! Mando entrar?
- Claro! Que entre!

quarta-feira, fevereiro 08, 2012

16-31 de Janeiro, vol.3.

Double trouble.

Manga DDT.

The stage is set.

16-31 de Janeiro, vol.2.

(not quite) Parallel lines!

Good wife? Under a lot of pressure!!

...everything i ever wanted...

16-31 de Janeiro, vol.1.

Minguante.

Carva.

Ode Marítima, Porto de Leixões, take two.

Nuvens ao voltar de Lugo - 6.




Nuvens ao voltar de Lugo - 5.




Nuvens ao voltar de Lugo - 4.




Jan 1-15 vol.3

Born sleepy.

Língua, nuvens, árvores, casas.

Ode Marítima, Porto de Leixões, take one.

terça-feira, fevereiro 07, 2012

Jan 1-15 vol.2

Nice stage, no actors!

Going nowhere fast.

Zona Industrial do Porto, Peugeot.

Jan 1-15 vol.1

Um ventinho sempre sopra...

Um lugar para mim!

Both scared - and upside down!

Os Descendentes - 2011.



Podia acontecer a este filme como a Mário de Sá Carneiro, o qual, à procura de mais um golpe de asa, acabou por voiar bem alto, apesar da curta viagem. Este filme tem as suas duas horas e uma cuidada construção. Fica-se porém à espera, à espera, e o salto mortal nunca acontece. Porque o grande cinema vive de saltos mortais.
Clooney - Óscar Clooney? - é um advogado conhecido de Honolulu, com fundas e antiogas raízes na sociedade local. A esposa sofre um acidente de barco e fica em coma. A Clooney caem-lhe as duas filhas em cima, e o saber que era traído. Tudo isto tem algum sidekicking para poder ter tempo para expandir. Tem ainda a típica banda sonora havaiana - e as camisas, e os calções e as paisagens... - para fornecer um um curioso e bem pensado contraste com o estranho e dramático que por aqui há. Mas... o que acontece é que este filme "doesn't rise to the equation", para citar um meu conhecido. Nem a coisa das filhas acaba por ser assim tão complicado, nem o encontro com o amante acrescenta muito, nem com a esposa deste idem, nem o fim... Clooney está bem, a filha mais velha melhor - what a look! Beau Bridges faz um nice cameo. Aprendemos umas coisas sobre o Havai. Há um momento muito Sundance que mete umas terras...
Bom, e o Óscar vai para... who cares?

A Separação - 2011.



O Irão é um país abençoado. E explico: vive sob uma democracia islâmica que não é mais do que uma teocracia mal disfarçada, com uma oligarquia de clérigos e/ou militares e/ou mafiosos a viverem de um país riquíssimo - de recursos, de gente, de história, de localização estratégica - e a conseguirem, usando um proceder religioso anacrónico como força legitimadora, dominar uma sociedade civil fragmentada e prisioneira de múltiplas contradições.
Ah, bom, e então... abençoado? Sim, porque é habitualmente nestas casas que a melhor cultura, a que resiste e confronta e sublima e ultrapassa, acontece. O Irão tem uma meia dúzia de cineastas de topo ao nível mundial.

"A Separação" trata do atrás dito. Fragmenta-se uma família, burguesa e com filha única em colégio privado, porque um pai tem Alzheimer e um bom muçulmano não abandona o pai. Alzheimer, um nome ocidental, Ocidente para onde a mulher quer emigrar, porque está farta do Irão. E o Irão vai com as suas garras, as da peculiar justiça que por ali se faz, destruir e destruir e destruir. E há ainda mais, há a criada que toma conta do pai com Alzheimer sem que o marido saiba. E que depois cai e perde uma criança. Porque a perdeu?
"Porque perdeu aquela mulher a criança?" A solução deste mistério faz de "A Separação" o mais atípico dos filmes de tribunal, e num tribunal termina, sendo a juiza derradeira a filha, a sacrificada filha daquele trio, porque ela sabe a verdade e, na mais tenra das idades era vai julgar.
Grande filme, o melhor que eu vi em 2011.

O Deus da Carnificina - 2011



Polanski, Roman. Cineasta perseguido por questões antigas relativas a um evento de moralidade mais do que duvidosa. Moralidade? Antiga?

Num parque um miúdo bate com um pau noutro. Parte-lhe dois dentes. Os pais dos dois miúdos encontram-se da casa dos pais do agredido, para resolver civilizadamente a questão. Civilizadamente? O argumento é de Yasmina Reza, e retirado duma peça sua. Yasmina Reza é uma escritora francesa na berra, discutida mas não muito discutível. Polanski é o realizador perfeito para um pedaço de vida onde nada vai correr bem e a civilização algures perde-se. Melhor do que os homens as mulheres, um duelo de gigantes, Foster e Winslet. Este é um filme que não chega a oitenta minutos ou talvez chegue, pois quando correm as letrinhas do fim ainda há filme. Engraçado o jogo, a batalha, o descasque. As linhas cruzadas entre as classes, os sexos, os deveres e prazeres.

Este filme é um prazer, ainda que não adiante nada. "I believe in the god of carnage!" Bom, adianta lembrar isto.

segunda-feira, fevereiro 06, 2012

Nuvens ao voltar de Lugo - 3.




Nuvens ao voltar de Lugo - 2.




Nuvens ao voltar de Lugo - 1.




Fernando Lanhas.


Morreu um dos pintores portugueses do séc. XX de que gosto mais.

quinta-feira, fevereiro 02, 2012

notícias do bloqueio dois

Como "A Ressaca": a dois é bem pior.

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Todos os castelos são feitos no ar.

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Caiu ao chão o frasco de Nutella. Trata-se de um bom sinal, o luto das coisas também é um tempo violento. Um destes dias então vou cair, mas acompanhado.