quarta-feira, novembro 29, 2006

Ainda o Cesariny - example of a flawless poem

Mário Cesariny só terá talvez sido excedido por Pessoa no século que passou na capacidade excelsa que tinha de parir poemas PERFEITOS - redondos, mágicos, cintilantes. Com a vantagem - sobre Pessoa e heteronomía - de serem poemas com paixão anexa.
Como muitos outros blogs, mas como exemplo do que acima se diz, aqui vai um dos ´"já clássicos":



O navio de espelhos
não navega, cavalga

Seu mar é a floresta
que lhe serve de nível

Ao crepúsculo espelha
sol e lua nos flancos

Por isso o tempo gosta
de deitar-se com ele

Os armadores não amam
a sua rota clara

(Vista do movimento
dir-se-ia que pára)

Quando chega à cidade
nenhum cais o abriga

O seu porão traz nada
nada leva à partida

Vozes e ar pesado
é tudo o que transporta

E no mastro espelhado
uma espécie de porta

Seus dez mil capitães
têm o mesmo rosto

A mesma cinta escura
o mesmo grau e posto

Quando um se revolta
há dez mil insurrectos

(Como os olhos da mosca
reflectem os objectos)

E quando um deles ala
o corpo sobre os mastros
e escruta o mar do fundo

Toda a nave cavalga
(como no espaço os astros)

Do princípio do mundo
até ao fim do mundo


in A Cidade Queimada, 1ª ed 1965, últ. ed. 2000, Ass. & Alvim (antologiado com ensaio crítico também no "Século de Ouro...").


PS.: mas bom-bom mesmo é conhecer a poesia de Cesariny outra, a menos "turística", cheia de ironia, bicos e desastres e cancioneiro...

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Carta número cinco

Meu caro amigo:

Serve esta carta não mas também para lembrar a última vez que nos vimos, em serviço urgente de amigo seu com pequena complicação física. O meu amigo trajava de uma forma tribal definida, e eu fingi não reparar que o seu amigo era mesmo muito seu amigo. Falámos dos bons velhos tempos, refizémos diagnósticos certeiros, prometemos almoços próximos, lautos como manda. Que sabíamos nunca iriam acontecer.
Lembro-me das poucas vezes que realmente lhe terei dado a palavra. Jogávamos na mesma divisão, a do riso e do olvido, embora o armamento fosse confusamente díspar. Ou seja, poucas vezes realmente o ouvi. Reparo agora que era homem de acertar nas suas medições e juizos. Ou de se calar quando não sabia.
Meu caro, como sabe temos amigos comuns. Acredito que me imagine não como pessoa onde a maldade germine de uma forma violenta e porém… Assim, periodicamente com amigos comuns lembrava e analizava a sua particular pessoa. Na realidade o que eu queria era saber de si. Sempre estalavam rápidas e compungidas declarações de tristeza pelo fado e destino do meu caro. Porque a sexualidade é um rio onde sempre nos habituámos a frequentar uma margem só. E confesso: quase por medo dos comentários automatizados agora já não pergunto pela sua pessoa. Imagino porém que a vida lhe corra como sempre, obrigado a cuidados de assepsia matinal porque lá fora eles vigiam, e lá fora nunca será como queria o meu amigo que fosse. Estará agora um pouco mais calvo, e digo-lhe já que a calvície não deixa de ser cómoda – é a minha opinião. E de certeza já esgotou aquela arca cheia que tinha com anedotas sobre paneleiros. Tenha pena de não saber de si. Telefone.

Um abraço.
W.

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Amadeo na Gulbenkian


Por falar em génios...

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terça-feira, novembro 28, 2006

Quarta Carta

Cara amiga:

Lembrar-me de si é lembrar-me de muitas coisas. E é lembrar-me de si.
Um amigo meu tem um irmão gémeo. No casamento dele vi-o de raspão. Não são
demasiado parecidos. Tendo a palavra demasiado o significado de podermos suportar o facto de um amigo ter um irmão gémeo. Coisa esta de não gostar de gémeos univitelinos. Ele lembra-se de si, inscrita jovialmente no tempo em que jogávamos no mesmo clube. O eu ser mais velho explicará o resto, o facto de o seu marido me ter escolhido para dois telefonemas, separados um do outro por poucos meses. O seu marido fez bem. Comecei só aí a sonhar consigo. O que antes era futebol passou a indoor, não sei se me faço entender. Pode explicar isto ao seu marido, talvez ele aprenda.
Tudo isto aconteceu ainda antes de determinados sapatos vermelhos, referência cinéfila obscura até para mim, que nunca vi o filme e que nunca a vi dançar, menos ainda entoar sequer uma canção. A sua vocação administrativa para gerir o tempo que lhe resta para viver: filhos, marido, trabalho, gera em si alguma tristeza, eu sei. E sei ainda que só o drama a espera, nestes anos que vêem: virá a inevitável morte do ente mais querido, e uma vida curta a tornar-se ainda mais estreita. Saudamo-nos hoje a espaços, um que outro papel partilhado. Sei que falta com frequência, para não faltar. E que o uso dos tais sapatos vermelhos se tornou raro. Ou sempre foi?
(…)
O que atrás mencionei não roça sequer a verdade: não faço a mais pequena ideia se alguma vez sonhei consigo. Sonhos bons não acordam meninos. Pensei, e penso muito em si, isto é que é. Porque é uma mulher muito bonita, e muito boa. Porque gostamos um do outro. E porque, ao deixar de pensar em si, a sua leveza contagia-me e o seu abdicar dá-me um certo sossego, levando-me a suportar esta outra espera em que vivo, já que na minha vida não se adivinham dramas, nem irá morrer ninguém nos tempos mais próximos. Eu sei que tenho sorte.

Obrigado


W.

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19b.


Mas por enquanto...

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Biscuits for Breakfast 2006


Fink é a última grande descoberta da Ninja Tune. Talvez mesmo a última. E trata-se um rapaz, efectivamente depressivo mas não sabemos se urbano, e que faz a melhor das pontes entre... a electrónica, vagamente alemã, e o blues, bem americano. Disco equilibrado, muito eficaz no variar entre as programações e o acústico e, por aqui e por ali, com algum clássico. Uma possível referência neste ano. E não é folk!

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Por exemplo isto (o Cesariny deixou...)

coro dos maus oficiais de serviço
na corte de epaminondas, imperador



uma morte loura
simpática
acolhedora
que não dê muito muito que falar
mas que também não gere
um silêncio excessivo


uma morte boa
a uma boa hora
uma morte ginasta tradutora
relativamente compensadora
uma morte pedal espinha de biciclete quase carapau
com quatro a cinco sôltas a dizer
que se êle não tivesse ido embora
tão jovem tão salino
boas probabilidades haveria de ter
de vir a ser
dos melhores poetas pós-fernandino

vá lá vá lá Mário
uma morte
naniôra
que não deixe o esqueleto de fora como nos casos do mau gôsto
os esqueletos têm sempre um quê de arrependidos
se bem que por aí já convinha lá isso já também era verdade


o demais demora
e
francamente
nunca será teu

vá vá vamos embora

custava-te menos agora
e ainda ias para o céu


in Manual de Prestidigitação, 1ª ed 1956, edição defin. 1981

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Morreu o Cesariny


Portugal anda a ficar escasso de génios. E não é que morreu o Cesariny?
"Poeta genial e pintor surrealista", assim escrevia em 1ª página o "Público". Vida e arte fundidas numa só peça, e assim até à morte.
Pobre país que tão pouco se deixou seduzir por um dos seus maiores sedutores. Aparentemente estranharam a pouca gente no enterro alguns cronistas.
Um amigo meu, médico, aqui há anos iniciou uma triste e idiota apresentação - sobre tema médico - com o poema "Pastelaria", lido nervosamente e de frente para vários olhares incrédulos se não ensonados de profissionais da arte de Talma/Galeno, whatever.
Perguntei-lhe porque o tinha feito, ler a "Pastelaria" em ambiente tão pouco propício. Ele apontou várias razões - nem todas confessáveis, talvez - mas a maior seria a "piada" da coisa em si.
Pelo que tenho lido - e a poesia não é o menor dos documentos sobre - Cesariny tinha um finíssimo sentido de humor. Portugal anda também a perder piada.

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quarta-feira, novembro 22, 2006

A vertente sudeste da serra do Courel



Possivelmente menos conhecida, é a imagem em espelho da Devesa de Rogueira. Na palavra composta "sudeste" o sufixo terá a força maior, pois a vegetação é menos exuberante, a pedra nota-se mais, os estratos geológicos tentam mostrar toda a sua antiga força. Vales apertados sucedem-se com pequenas aldeias aqui e ali dispostas, cenograficamente, as maiores divididas em "bairros", que mais não são que sub-aldeias divididas por uma dezena de metros entre si.
Juridicamente estas terras são concelho de Quiroga, sendo esta uma vila algo distante para sul, já nas margens do Sil.
De vez em quando a vegetação pára quando afloramentos graníticos irrompem do solo, são os chamados "taros".

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A Seara


Aldeia de dimensão respeitável esta, é a referência para o Courel para quem o quer visitar pelo lado de Quiroga.
Nota-se injecção de dinheiro gordo na reabilitação das casas, reabilitação que nem sempre é muito feliz.
Um exemplo é o aparecimento em casas de xisto recuperadas de chaminés enormes, aparatosas, tipo navio de cruzeiro, quando a casa de xisto antiga não parece ter chaminé.
Quase toda a recuperação parece estar a ser feita mais para 2ª habitação do que para 1ª...
O nome aparecerá pelos campos férteis que rodeiam a aldeia. Aqui já não estamos em território do rio Lor mas sim do rio Selmos, que tem uma zona de rápidos e cascata dentro da própria aldeia (!). Já agora, uma observação: senhores excursionistas, quando entram numa aldeia como A Seara, vestidos à alpinista, pelo menos recolham os piolets - ao ser último modelo serão retrácteis - para melhor aclararmos a dúvida de quem a qualidade de extraterrestre: da aldeia ou dos visitantes de fim-de-semana?

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A Fervenza de Vieiros


Digo e repito que esta terra é muito terra de muita água.
Este é um percurso muito agradável, onde se podem observar duas quedas de água muito bonitas, uma delas vislumbrando-se já da estrada. Um pouco de desnível para animar, uma estúpida cancela lá pelo meio que é para passar. Vieiros fica pouco antes de A Seara. A fervenza pouco antes de Vieiros. Aqui já é concelho de Quiroga, vertente sudeste do Courel.

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Ferramulín


Fica este recanto de judas na vertente sudeste do Courel quando, depois de lhe darmos a volta e começarmos a descer para sul, nos negamos a entrar na província de Leon e sair da Galiza, e viramos para A Seara. 200 metros e é Ferramulín.
Outro nome de terra ferruginosa, onde já houve minas e fundição.
Ao contrário de Seceda, ou de A Seara, os dinheiros da Xunta não se notam. A aldeia não está completamente abandonada, mas há muita casa fantástica a cair. Um rio existe que divide a aldeia em um bairro já transformado, incaracterístico, onde vive alguma gente menos velha. Para sul do rio e do moinho que aparece sempre nos folhetos (em ruínas), só casas de xisto da mais pura arquitectura do Courel, umas mais degradadas do que outras. E um casal de (muito) velhos. "Esta casa por dentro fixeran-na os portugueses. Traballaban moi ben i barato.. fai moito ano..."
Misturámo-nos com as gentes, vimos a recolha dos animais. Aqui e ali, alguém compra uma ou outra casa para 2ª habitação. "A casa é moi bonita pero xove dentro como na rúa. É preciso alousá-la..." Peço desculpa pelo mau galego. Em terras de xisto, alousar é dar telhado a uma casa.

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terça-feira, novembro 21, 2006

A Devesa de Rogueira


As devesas, os bosques autóctones nas encostas destas montanhas, preenchem na quase totalidade as alturas intermédias do Courel.
Cada aldeia, cada lugar tem a sua.
E todas são fantásticas. As mais simples são um souto com um pequeno entremeio de faias e de carvalhos.
Mas a Devesa da Rogueira é o bosque mais extenso, possivelmente a melhor conservada e, pelo desnível abrangido, dos 600 aos 1500 m de altitude, apresenta uma enorme variedade de espécies arbóreas, distribuidas por estratos que se nos apresentam exuberantemente à medida que subimos. Ah, e água por todo o lado.
E sobe-se muito. Nós até nem subimos tanto assim. Mas vimos que chegue. Se se puder evitar em fim-de-semana, melhor.

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Casa Valín



A casa Valín fica em Seoane do Courel, 2ª povoação mais importante do concelho de Folgoso do Courel. Terá uns 200 habitantes. Fica na estrada Pedrafita do Cebreiro-Quiroga. No entanto a melhor forma de entrar nesta secção do Courel é vir de Lóuzara por Pedrafita do Courel e começar lentamente a descer a estrada que segue a meia ladeira por norte o vale fundo do rio Pequeno. De um lado e de outro sucedem-se as devesas e as aldeias. Ao entardecer, com os castanheiros a pegar fogo, este é o Outono definitivo.
Chega-se lentamente a Seoane, intoxicado. Lentamente recuperamos. Seoane está bastante descaracterizada. Tem um Claudio (supermercado) que está aberto sempre. Três restaurantes que estão abertos de vez em quando. Dois cafés. Oque não tem bilhar nem televisão dá informações. Porque em Seoane não há posto de informações. Não há uma estação de serviço.
A casa Valín fica na encosta na parte baixa da aldeia. Desci a Scenic duas vezes pelos devidos quelhos, felizmente sem sequelas, mas com bastante stress. Para descarregar e carregar as malas. Fora isso, o carro ficou na estrada. O quarto é no r/c, a antiga quadra dos animais. Em frente e do outro lado da rua currais. Na transversal de cima a farmácia. A vista é para a montanha e para o vale do rio Lor, para sul.
Para acesso à parte norte (e mais conhecida do Courel) é a base a ter.

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quarta-feira, novembro 15, 2006

José Veiga de Azevedo

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terça-feira, novembro 14, 2006

Incio


Incio não existe. A cabeça de concelho é um cruzamento com um largo e vinte casas. Tem um supermercado e uma loja de ferragens que vende tudo. Em todo o concelho não há uma estação de serviço. Aliás em Folgoso também não há, há que subir a Pedrafita ou descer a Quiroga...
Incio tem um campo impoluto, vivo, debruado a soutos e carvalheiras, ondulado em pre-montanha, humedecido por dezenas de ribeiros. Animais e gente mantêm viva uma terra que lhes paga com a sua fertilidade.
Mas quando aqui nos instalamos a 1ª coisa que nos sugerem é o Courel...

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Samos



O mosteiro de Samos terá muita história, mas a visita que lhe é feita não é demasiado explicativa. As pinturas do 1º andar, pintadas após o incêndio dos anos 50, são para esquecer. O frade era porém muito simpático. Perguntem-lhe a história das silvas de San Benito, que não têm picos...
O frade que nos recebeu à entrada disse-nos: " se quereis visitar o mosteiro tereis que esperar pela meia-hora, ser meus amigos, e pagar três euros cada". Incluindo a criança. Samos, como todas as terras por aqui, também tem direito a rio, com passeio pedonal paralelo anexo,por onde se pode dar uma volta panorâmica às terras do mosteiro. Samos tem um albergue para os peregrinos do camino de Santiago, sendo aqui uma das paragens principais já em terras galegas.

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O vale do rio Louzara.


Por aqui se mete em direcção a Samos, sendo o Louzara um pequeno e simpático rio que depois termina no Lor (e este no Sil, e este no Minho). As terras de Louzara são um vale verdejante, bem cultivado, encaixado entre montes. De brinquedo. Grutas e cascatas de água por todos os lados. Fomos comer junto às de Aguadalte. O méson em Paredes de Louzara é o único restaurante em muitos kms em redor. O caldo e as doses são maleáveis, vamo-nos servindo enquanto quisermos.

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A Casa do Cabazo


Aqui ficámos os primeiros dias, terrras de Incio, concelho rural como poucos. Propriedade de madrilenhos tranquilos e simpáticos. Quartos correctos, jantar em comunidade, informação a que quiseres. A casa, que era de lavoura, uma recuperação exemplar. Cães e gatos. No vizinho do lado ovelhas, e vacas.

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Ferreria de Incio


Duas coisas dominam a história destas terras: as águas que curam, daí um balneário em ruínas, e o ferro, buscado incessantemente desde os romanos. Um antigo hotel está em recuperação, a antiga fundição desapareceu. A aldeia sobe monte acima, debruada a água e a verde, amarelado por Novembro. Xisto por toda a parte. Aqui e ali gentes que recolhem as ovelhas, apanham a castanha, as nozes... Esta aldeia ainda não morreu.

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Hospital de Incio


A igreja românica de S.Pedro de Fiz fica num lugar chamado Hospital e, lembremos, que um ramo sul do caminho de Santiago por aqui passa. Quando descemos a visitar a igreja, rente à estrada, logo uma égua em alegre trote nos veio saudar e comer da nossa mão. Parece que o faz sempre. Do outro lado da estrada uma casa solarenga brasonada compunha o ramalhete, mais os soutos à volta, e as carvalheiras cerradas e íngremes a descer da estrada para o fundo onde se ouvia água ...

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Férias

Nas últimas férias, feitas à procura do Outuno no monte da Galiza, estivémos nos concelhos de Lugo do Incio, Samos, Folgoso do Courel, e Quiroga. O objectivo era a serra do Courel, com as terras de Incio como antecâmara.
Uma série de posts ilustrarão sítios e momentos.

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19.


Assim será dentro de poucos anos, uma última volta no baloiço e desapareces, poeira de luz da mais fina tornada lembrança e ilusão.

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18.


Uma epifania.

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O livro do diabético meu amigo

Um amigo meu , que é médico, recebeu em 1ª consulta um doente que em sala de espera tinha estado a ler os "56 poemas" do Ruy Cinatti. Ficaram amigos para a vida.

Mas existe hoje, nas montras cheias de vaidade da poesia actual, alguém que se compare minimamente ao Ruy Cinatti?

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domingo, novembro 12, 2006

Maria



Perdeu? A sério?

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Carta Terceira

Cara amiga:

Vimo-nos recentemente e fizemos as devidas actualizações. Ficaste a saber como vão as coisas e eu onde vão ficando. De corações se trata a tua vida e por aí andas neste preciso momento, parece.
E tudo isto para te dizer que aquela fotografia que te devolvi há muito tempo, dela nunca me irei esquecer.
Estavas então grávida do teu único e hoje enorme filho, e assim apareces nela, por entre pinheiros. Com o cabelo cortado pelo partido, estavas possuída por uma cara de espanto engraçado, que amenizava a gravidez avançada que saía do teu vestido de corte afinal clássico.
Seria um piquenique. Estariam todos a pensar o mesmo. Mas o teu pensar era sempre mais leve, um pouco mais triste. “Eu?” Isto pensarias talvez. Embora o fotograma seja de segundos depois e a boca desenhe mais um “Oh!” que sempre antecedia um riso teu em que o corpo se inclinava habitualmente em três quartos para o lado. E aí prendias o riso.
Não vou agora aproveitar para redefinir a maldade do nosso afastamento. Fiz-te mal, eu sei. Um clássico de atropelamento e fuga. Mas não importa, atrevo-me a dizer. Hoje, estes anos depois.
Ninguém tentou querer mais a mulher dessa fotografia do que eu.

Sempre atentamente

W.

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Borat no YouTube

"In Kazakhstan we love animals!"
"You do? So what do you do to them?"
"We shoot them!"
"Why?"
"For fun."

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Diz 2001


À 3ª a coisa tremeu um pouco. Em 2001 Carlos Bica, juntou-se com a actriz e cantora Ana Brandão para gravar um álbum, que já era uma comissão da expo1998, e que tinha uma vertente importante de palco, performativa. Como todo o jazz...
Ana Brandão não é bem uma cantora de jazz. E apesar da excelente voz o uso da exclamação não disfarça algumas incertezas, só algumas. O disco tem alguns temas muito bons, a patine de arranjo e de composição de C Bica é excelente, o piano de João Paulo ora está superior ora joga ao comme d'habbitude. Vale a pena ouvir.
Consta que o disco ao vivo é brilhante, e que o deve à Ana Brandão, actriz que é ou foi do Bando. O disco continua a ser apresentado ao vivo por estes dias.
É ver.

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Black Mahogany 2004


Detroit é a cidade mais negra do mundo. Deve ser. Onde se inventou o techno. E se 15 anos depois banharmos Curtis Mayfield e Marvin Gaye nestas águas aparece Moodyman. The soul of the stars is black.
And the more important ones are black holes.

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sábado, novembro 11, 2006

Slappers 2006


Dani Siciliano, está com Matthew Herbert em música e em carne e osso desde 1998. E nota-se.
Estamos no 2º álbum, e Dani segue caminhos perigosos.Trata-se de obra entremeada de várias coisas ao mesmo tempo, mas que, e comparando com "Likes..." de 2004, tem menos pop, e portanto um pouco menos de Herbert. Mas ainda não é só Dani.
É um manifesto de swing atípico, quase sem pop, e com alguns espaços de abertura na produção Herbert. Um desequilíbrio divertido. Soa às vezes a clarinete (que Dani começou a aprender aos 7) tipo Dixieland, e leva umas letras tipo "wake up girl" lá pelo meio. Feminista? É. Obra-prima? Não. O perigo da monotonia paradoxalmente espreita. Lembra Mathilde Santing sem a melancolia, sem o lirismo. Não descansa.
Mas ouve-se muito bem. Herbert só co-produz...
PS.: ""slapper" is a vicious girl, a vulgar one..."

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quarta-feira, novembro 08, 2006

Carta Segunda

Minha cara amiga:

Ultimamente não tenho podido ir tomar café consigo.
Eu explico: não me deixam. Encontro-a sempre rodeada de gente mais jovem ou não, mas que busca em si o mesmo serviço no qual disfarço a minha especial atenção – querem comer. Acontece tudo isto em dia de particular rebuliço nos meus afazeres profissionais. Confesso porém que a sua silhueta magra e angulosa tem preenchido alguns dos espaços em branco em que paralizo os meus dias.

Estimo particularmente os poucos dias em que me deparei consigo em exérese do seu uniforme profissional, dotada portanto de roupa outra, onde notei afinal alguma instabilidade, perdoe-me a liberdade, na sua própria definição do feminino. Porém, ao seu livro de imagens, como catálogo profissional, não têm sido adicionadas novas vinhetas nestas últimas semanas, e disso se ressente o seu autor, este modesto fotógrafo ignaro e ridículo.
Nasce esta carta porém não de um desespero mas de uma emenda, palavra interessante que até tem nome de rua: alteradas que foram as minhas rotinas queria combinar com a minha cara amiga nova rotina estimulante esta, cuja duração e dimensão não necessitaria ser nem "curto" nem "comprido". Julgo que ainda se lembrará que eu o café quero-o normal.


Atentamente seu

W.

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Single 2005


Como segunda audição do universo Carlos Bica decidi-me logo pela mais drástica: um disco de contrabaixo solo, editado o ano passado pela Bor Land, e que mais do que jazz, é todo um universo. Não fugindo à ocasional melodia, este disco de uma melancolia tensa e requintada, mostra duas riquezas, a primeira a de um instrumento ainda misterioso para muitos, a segunda a qualidade de composição de Carlos Bica. 17 temas 17 que duram de 52" até 5'51". Só a última faixa tem overdubs, efeitos de estúdio. As restantes 16 são gravadas singelamente. Só ouvindo.

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